Dando sequencia ao que
anteriormente foi postado, esta postagem parcial do livro Amar e Escrever traz os
poemas da página 41 à página 60.
REVEZAMENTO
A vida é luz. Por isso mesmo, quando
uma foge de nós, outra aparece,
e enquanto luzes vão se revezando,
nossa alma se apraz e se embevece.
No mundo tudo ocorre sem desmando,
conforme o Criador estabelece:
é o Sol toda tarde declinando
no horizonte,
onde o azul sempre enrubesce...
É, após cada lírico arrebol,
cansado e sem fulgor, buscar o Sol
um lugar no Ocidente, onde se acoite,
para a Lua, que logo se aparata
com seu luzente encanto cor de prata,
assumir o papel de “Sol da Noite”.
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ROSA
(A
Rosário Vidal, in memoriam)
Rosa mulher,
Rosa mãe,
Rosa amiga,
Rosa coragem!
Rosa cujo ato simbólico
Do que se costuma chamar
“Último adeus”
Não roubará a constância
De sua presença em nós.
Rosa que, ferida
Por humano mal,
Não se despetalou
Nem caiu do galho.
Rosa imarcescível
Que será sempre viçosa
Em nossa lembrança
E no jardim de Deus!
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MUSA
No dia em que
me aproximei de ti,
eu – já fazendo
as vezes de poeta –
entre outras
tantas musas, te escolhi
para seres a
minha predileta.
Não demorou,
contigo me envolvi
em relação mais
forte, mais direta,
e não bastasse,
ainda me senti,
diante do
mundo, um verdadeiro esteta.
Então, passei a
dedicar-me mais
à busca de
expressar poesia em versos,
sob os impulsos
de vontade extrema.
No entanto, se
ao meu lado não estás,
sentindo os
pensamentos tão dispersos,
não
consigo escrever um só poema...
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NO CURSO DA TRAVESSIA
Enquanto a
vida atravesso
distâncias
eu nunca meço
nem procuro
pôr medida
em certas
coisas que faço.
Seguindo o
destino meu,
mantenho o
mesmo compasso,
alma solta,
embevecida,
seja em
subida ou descida,
em plano,
em curva ou em reta;
e se não
quero ser eu,
ora me faço
palhaço
ora me
torno poeta.
No curso da
travessia
alternando
esses momentos,
vou feliz,
me realizo,
pois não só
arranco o riso
dos
carentes de alegria,
como também
verbalizo
emoções e
sentimentos
que me
desperta a poesia.
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CONDIÇÃO SINE QUA NON
Numa manhã de
sol; na queda de uma folha;
na leveza da
pluma a flutuar ao vento;
na noite de
luar; na rosa que se colha
para ofertá-la
a quem nos traz contentamento...
Num abraço de
amor de alguém que nos acolha;
nos cuidados da
mãe, com seu olhar atento;
e até mesmo no
ato em que pequena polha
agacha-se e se
entrega ao acasalamento...
Enfim, no que
ele vê, tateia, pensa ou sente,
acha o
versejador a poesia latente,
pronta a
fazer-se verbo, em variados temas.
Mas na
satisfação de tal desiderato,
bom poeta será
somente quem de fato,
mais que
versos, mostrar poesia em seus poemas.
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PRIMAVERIL
(À memória de Vânia)
Ela foi trazida à
luz
em 22 de setembro,
por certo, no mesmo
dia
em que chega a
primavera
aqui em nosso
hemisfério.
Com alma
primaveril,
marcada pelo
cuidado
que tinha com seu
jardim,
curtiu o cair das
folhas
ao vento de seus
outonos,
aqueceu com nosso
afeto
o frio de seus
invernos,
agradeceu sempre ao
sol
o calor de seus
verões,
e foi num desses
verões
que Deus a tirou de
nós.
Mas, enquanto no
caixão,
entre rosas
amarelas,
o seu corpo era
levado
para ser entregue à
terra,
havia em seu rosto
morto
viva expressão de
um sorriso,
como que para
mostrar
que,
concomitantemente,
seu espírito feliz
viajava rumo ao Céu
em clima de
primavera.
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POR CAUSA DOS EXCESSOS
Uma aurora; um
poente; um sobe e desce
de marés; uma
noite enluarada;
um rio a
desenhar curvas em esse;
um bando a
levantar-se em revoada;
uma ave canora
que emudece
ao se ver de
repente engaiolada;
um grupo humano
ajoelhado em prece;
um... (paro
aqui, sem escrever mais nada)
Não falha! Em
referência aos meus poemas,
sempre deixo
incompleto um rol de temas,
em razão dos
excessos que cometo.
Esse último eu
pus de lado, quando
percebi que o
estava organizando
na clássica
estrutura do soneto...
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OS DEDOS DA MÃO
Cinco diferentes dedos
na arquitetura da mão,
cada um com seus segredos
e específica função.
Fala por nós sempre assim
o POLEGAR, ou “dedão”:
para cima, diz que é sim;
para baixo, diz que é não.
Seu vizinho – o INDICADOR –
assim se chama, em razão
de ser meio delator,
tipo “X-9” da mão.
Grande, robusto e imponente,
o MÉDIO, o maior dos dedos,
tendo fama de indecente
gera desejos ou medos.
Por sua vez, o ANULAR
tornou-se o da confiança,
por seu papel singular
de suporte de aliança.
O MÍNIMO é entanguido,
porém se mostra feliz,
limpando cera de ouvido
e meleca de nariz.
Tudo é teórico. Então,
você – homem ou mulher –
faça dos dedos da mão
o uso que bem quiser.
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ENXERTIA
Tu apenas me
vias, bem igual
a mim que
também mal te conhecia,
até que a sorte
provocasse um dia
entre nós um
encontro “casual”.
Foi esse
encontro o passo inicial
para uma
convivência em harmonia
da minha
incontrolável ousadia
e o teu recato
comportamental.
Dois simples
talos de distintos ramos,
de aparente
incompatibilidade,
nos atraímos e
nos enxertamos.
E desde então,
vamos crescendo unidos,
dando, no amor,
sustentabilidade
aos novos ramos
de nós dois nascidos.
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LAMENTOS
ESCRITOS
Já fazendo um mês de ausência,
o que eu mais queria agora
era que me fosse dado
fechar os olhos e abri-los,
feliz da vida, a teu lado.
Ficar contigo na cama,
o amor a nos inspirar,
com excitantes arpejos,
uma recíproca troca
de mil abraços e beijos.
Usar minhas duas mãos
para acarinhar-te o rosto,
o pescoço, o ventre, os seios,
em suma, todo o teu corpo,
nós – a tudo mais alheios.
E não, tê-las como agora:
uma, empunhando a caneta,
que vai marcando o papel
com meus lamentos escritos,
por essa ausência cruel.
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ENTRE VITÓRIAS E DERROTAS
Sei
caminhar descalço, numa boa,
Sempre
que são de chão macio as rotas.
Pisar
pedras, porém, não me atordoa,
Pois
para isso calço minhas botas.
Por
vitórias, minh’alma não entoa
O
canto das vanglórias idiotas,
Porque,
a exemplo de qualquer pessoa,
Também
costumo ter minhas derrotas.
Mas,
se caio e na queda me espedaço,
Nunca
me abato, não me entrego ao pranto,
Nem
fico a lamentar o meu fracasso.
Mesmo
caído, tento dar um jeito
De
juntar meus pedaços, e levanto
Assim que me apercebo já
refeito.
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CHORO SECO
Encostei-me no
espinheiro
E me feri nos
espinhos.
Culpa minha,
Por passar onde ele
estava?
Ou culpa dele,
Por estar onde eu
passava?
Não recordo,
realmente,
Se fiz tais
indagações.
Só sei que soltei
um grito,
Senti dor e até
chorei
Do jeito que sei
chorar...
Não cortei o
espinheiro,
Deixei-o quieto em
seu canto...
Depois de uns dois
ou três meses,
Passei por ele de
novo
E o vi triste e
quase morto,
No mesmo lugar,
fincado
No chão duro feito
pedra
E seco de fazer
dó...
Mais uma vez eu
chorei
Do jeito que sei
chorar...
Não caíram de meus
olhos
Lágrimas para
ajudar,
Mesmo de forma
minúscula,
A molhar o
espinheiro.
Porém não foi em
revanche
Por ele me ter
ferido,
Sim, porque só
aprendi
A chorar um choro
seco,
Que dói mais que outro qualquer...
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REFLEXÕES (EM OUTRO PLANO)
Imaginei-me ao lado do Senhor,
no outro plano, a buscar em minha
história
se o que Ele me ensinara sobre o amor
pude aplicar na humana trajetória.
Conferi tudo, sem tirar nem pôr,
e concluí ter sido meritória
minha acolhida para o esplendor
da vida, no imortal Reino da Glória.
Isso inferi, em face do prazer
que eu sentia, ao deitar-me, consciente
de que amei sem retorno pretender,
como recomecei cada manhã,
feliz, minha missão de encontrar gente
para
amar, cada vez com mais afã!
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POTENCIAL
Vida, palco de
cenas conflitantes,
no qual o
personagem, feito ator,
deve atuar
tornando-se vetor
só do bem, para
si e os semelhantes.
Mas é preciso
que se cure, antes,
de todo vício
que possa supor
capaz de
provocar o desamor,
como o egoísmo
e suas variantes...
Quanto a mim,
aprendi o uso perfeito
da droga certa
para cada mal,
longe dos chás
de duvidoso efeito.
E já posso, por
minhas atitudes,
acreditar no
meu potencial
para
ser praticante de virtudes.
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TUDO POR AMOR
Se hoje posso
fazer seja o que for
como prova de
quanto te mereço,
para nunca
perder o teu amor,
decerto,
pagaria qualquer preço.
Poderia mudar a
forma e a cor
de tudo e virar
tudo pelo avesso;
seria, mesmo,
até capaz de pôr
o fim e o meio
antes do começo.
Se porventura,
por ter-me excedido
nesse te amar,
me fosse conferida
uma das formas
de letal castigo,
no instante do
meu último pedido
suplicaria um
dia mais de vida
para de amor eu me exaurir contigo!
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SEM INSPIRAÇÃO
Até agora tenho me
sentido
um tanto diferente
do que costumo ser.
Impotente para
empunhar a pena,
assim completamente
cego, surdo e mudo
para a poesia,
estava esquecido
de que hoje dei o
dia de folga
ás minhas musas...
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DUAS PARTES
Se realmente sou
poeta
como dizem por aí,
pertenço ao grupo
daqueles
que pouco saem do
chão,
pois libero apenas a
parte menor
do que em mim sente
e pensa,
para voos em busca
de poesia
em mundos abstratos.
A outra é a parte
intrínseca,
a que jamais se
desgruda de mim,
por estar sempre
envolvida comigo
na poesia que se
materializa,
de instante a
instante,
em minhas relações
com gente
– meus iguais neste
mundo real
em que a vida me
ocorre.
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SER FELIZ
Ninguém no
mundo sabe, na verdade,
Um conceito que
a torne definida,
mas todos
buscam a felicidade,
por entendê-la
imprescindível à vida.
Ser feliz!...
Ideal feito vontade,
na qual toda pessoa
em si lapida
essa esperança
de que, um dia, há de
ver a vontade
em fato convertida.
No meu afinco
para ser feliz
de cada
desprazer fiz um prazer,
de cada
pesadelo também fiz
um sonho, leve
de sonhar e lindo,
razão por que
todos me podem ver,
até quando a
dormir, sempre sorrindo!
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BORBOLETA
Que sempre haja
flores
por onde eu deva
passar!
Se fosse
para eu não voar,
para não misturar
minhas cores
às cores das
flores,
para não me
inebriar
com o encanto
e o perfume delas,
Deus jamais teria
permitido
que eu saísse do
casulo...
________
QUADRINHA
Se poeta é
fingidor,
confesso que já
fingi,
porém, quanto ao
meu amor,
nunca finjo para
ti.
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CRISTÃO
Há muita gente
que frequenta igreja,
encena fé, ouve
sermões e ora,
mas humilha os
irmãos e os apedreja,
sem qualquer
compaixão, quando aqui fora.
Essa espécie de
gente malfazeja,
em sua
hipocrisia, ainda arvora
o seu orgulho
disso, e não se peja
de dizer-se
cristão, a toda hora.
Saiba essa
gente que cristão é quem,
sem o vaidoso afã
de ser notado,
aqui se vota a
semear o bem.
Pois o bem
semeado, julgo eu,
é o passaporte
para o outro lado
da vida, que
Jesus nos prometeu.
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POENTE VISTO DA PONTE
Quando em meus
fins de tarde me revelo
com certa
irritação em mim acesa,
em razão das
pancadas que o martelo
dos deveres me
aplica com dureza,
logo do
estresse me desencastelo,
se deixo minha
mente apenas presa
ao que de doce
e essencialmente belo
sou capaz de
enxergar na natureza.
Então me ponho
a olhar de sobre a ponte,
em céu enrubescido,
o sol se indo,
aos poucos,
para a linha do horizonte,
até o instante
de ele me causar
essa impressão
de que – tão calmo e lindo –
escorrega do
céu e cai no mar!...
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60
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[Lago, Kleber. Amar e
Escrever. São Luís: KCL,
2014]
Agradeço
a atenção dos leitores!
Kleber Lago
© Todos os direitos
reservados ao autor.
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