sexta-feira, 9 de maio de 2014

AMAR E ESCREVER (Postagem Parcial 2)



Promessa feita, promessa sendo cumprida. E aqui estão os poemas das folhas 21 a 40 do livro Amar e Escrever:

 

 
  CRIME E CASTIGO
 
 
 
Vão ouvir muito a velha cantilena
em que afirmo que amar-te é tão sublime
e que eu te amo de maneira plena,
talvez bem mais do que meu canto exprime.
 
Mas se por isso o mundo me condena,
vivo pagando ao mundo por meu crime
e, alegre, cumpro minha doce pena
que tanto agrada quanto não reprime!
 
A pena é demonstrar como cresceu
em mim o que parece demasia,
enfatizando sempre que este meu
 
desejo de te amar cada vez mais
é como a fome que não se sacia
e a sede que jamais se satisfaz!
 
 
 
 
SÓ CONSIGO SER EU MESMO
 
 
 
Reconheço que, às vezes,
não resisto à tentação
de ser diferente do que sou,
numa espécie de curiosidade
de saber como eu seria em outro.
 
Até chego a dar
alguns passos nessa direção,
mas logo começo a me deparar
com atos, ações e pensamentos
incompatíveis comigo.
 
Então, faço o que devo:
paro, e dando um salto para trás,
caio de novo em mim.
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   FOI... É... SERÁ
 
Foi o encontro
de cargas de energia opostas,
traduzido numa troca de olhares,
que nos revelou, um para o outro...
 
Foi apenas um dia
para que ocorresse o primeiro beijo,
com sabor de adolescência
e calor de paixão nascente...
 
Foi somente o tempo limitado
de três curtos anos
para que vivêssemos
sensações ilimitadas,
que tanto nos fizeram flutuar
entre nuvens de ternura,
quanto provocaram loucuras
que deixaram hematomas
na “pele” de nossas almas...
 
Não foi mais que um instante
para que nós, atores da história,
saíssemos de cena,
 
 
 
cada qual para o seu lado,
e as cortinas do palco se cerrassem,
sem aplausos nem vaias
da platéia...
 
Mas é todo um resto de vida
para carregar esse fardo de lembranças,
que embora grande,
não me pesa nada...
 
Também será de leveza imensa,
e sem o menor sinal
de dor, magoa ou tristeza,
o prazer que sentirei
em levar esse fardo comigo
para a eternidade...
 
 
 
 
 
 
 
 
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             OPÇÃO
 
 
 
Amar! De vocação por mim sentida
inda na infância dos primeiros dentes,
inspirando-me afetos inocentes,
tornou-se minha faina preferida!
 
Amei e amo, nesta humana lida,
pai, mãe, irmãos, mulher, filhos, parentes
e amigos que estarão sempre presentes
em meus quadros de amor, por toda a vida.
 
Amar ou não amar? Se Deus um dia
ante o dilema me viesse pôr,
juro que, no momento de optar,
 
iria Lhe dizer que preferia
poucas horas a mais de muito amor
a viver um milênio sem amar.
 
 
 
PRONOMINAL
 
Só me senti
Gente de verdade
Quando aprendi a ser EU.
Não um EU
Que sirva apenas a MIM,
Mas um EU pluralizado em NÓS
E capaz de dividir-se
CONTIGO e também com ELES
Para estar presente em VÓS.
 
SER OU ESTAR
 
Se em dado momento
a poesia me chama,
vou de alma aberta,
dou-me inteiro,
fico nu,
não me cubro,,,
 
Mesmo assim,
sempre descubro 
em mim aquela pergunta
sobre a velha dúvida:
sou, ou estou poeta?
 
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        MÃE-POESIA
 
 
 
Quando Deus à mulher deu a missão
de mãe, mostrou de forma bem direta
que Ele, o Senhor de toda a criação,
tinha também Seus dotes de poeta.
 
É que não há no mundo outra expressão
de poesia que seja mais completa,
em beleza, ternura e emoção,
do que uma mãe cumprindo sua meta.
 
Ser mãe traduz, na plenitude, o amor,
pouco importa o lugar de onde ela veio,
o status social, o credo e a cor...
 
Mãe é poesia escrita a tinta forte,
e que não sai jamais de nosso seio,
nem quando a musa nos carrega a morte!
 
 
 
 
OLHOS SORRIDENTES
 
 
Na festa, em que eu dividia
a mesa com conhecidos,
jovem senhora, morena,
bonita e muito gentil,
amiga dos meus amigos,
confessou diante de todos
não cansar de olhar meus olhos,
porque meus olhos sorriam,
revelando uma alegria
de perene mocidade.
 
Finda a festa, já em casa,
fui de repente arrastado
pela curiosidade
para diante do espelho,
e então pude perceber
que tanto meus lábios
quanto meus olhos sorriam,
porém de mim,
que quase me envaideci
com aquela confissão...
 
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EMBRIAGUEZ DE ENCANTO
 
 
 
Seguindo a esmo pela manhã clara,
Parei ao ver, a dez passos de mim,
Um tipo deslumbrante de jardim
Que a própria natureza ali plantara.
 
Flores bordando um manto de verdores!...
À luz do sol, instantes alternados
De pousos leves e balés alados
De lindas borboletas multicores!...
 
Se foi um sonho, o sonho aconteceu
Para satisfazer minha estesia,
Com a combinação de luz e cor
 
De um quadro mais que lírico, em que eu,
Ébrio de encanto, já nem distinguia
O que era borboleta e o que era flor!...
 
 
 
 
      IGUAIS
 
 
 
Para a boa convivência
em grupos sociais,
ninguém precisa ser
o maior nem o menor,
o melhor nem o pior.
 
Basta sentir-se mais um
que a outros veio juntar-se,
sem nenhum preconceito,
e também sem receio
de que o vejam como é.
pois, no fundo, bem no fundo,
todos nós, seres humanos,
somos iguais, pelo menos,
nesse papel de hospedeiro
de virtudes e defeitos...
 
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MEU AMOR POR VOCÊ
 
 
 
Espírito e matéria para o amor:
Sapiência divina, na receita
De que Deus se serviu para compor
O poema dualista mais perfeito!
 
Alma sonhando!... Corpo com calor!...
É como a amo, pois que de outro jeito
Não seria capaz nem de supor
Que eu pudesse sentir-me satisfeito.
 
Não sei se minha ótica é correta,
Bem como se não é meu perceber
Simples deslumbramento de poeta.
 
Só sei que é grande o meu amor. E creia
Que, se comparo, sou capaz de ver
Todo o universo como um grão de areia!
 
 
        INVEJA
 
 
Desequilíbrio humano
Que se inclui entre os chamados
Vícios capitais
E que afeta invariavelmente
O espírito egoísta
De quem, não tendo em si certas virtudes,
Não consegue aceitar que outros as tenham.
 
Graças a Deus,
O sentimento de inveja
Sempre me passou ao largo,
Deixando-me aprender bem cedo
A ter consciência dos meus limites,
A aplaudir os que foram além de mim
E a incentivar os que se esforçam para ir.
 
Também me faço cego, mudo e surdo,
Para os que porventura me invejem,
Pois não vejo nenhuma razão para isso.
Melhor seria invejar os pássaros:
Eles voam com as próprias asas,
Enquanto eu nunca sairei do chão
Por mais que bata os braços.
 
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     AQUI E AGORA
 
 
 
Vou parafrasear velho ditado
para lembrar a “quem guarda com fome”
que tudo aquilo que se tem guardado,
muitas vezes, “o bicho vem e come”...
 
Sabe-se o que é presente e o que é passado,
porém futuro ainda é só um nome
dado ao que, simplesmente idealizado,
vira dúvida atroz que nos consome.
 
E antes que eu prove que um mais um são dois,
toda a minha esperança num depois
pode a morte apagá-la de repente.
 
Por isso, a cada instante, a cada hora,
eu me dou por inteiro, aqui e agora,
enquanto estou vivendo o meu presente.
 
 
 
     SATISFAÇÃO
 
 
Num desses meus pensamentos
que me chegam de relance,
me pedias um presente,
de valor material
acima do meu alcance.
 
E no instante imaginário,
lá fiquei, meio abatido
e quase a cair em pranto,
ante a impossibilidade
de atenção ao teu pedido.
 
Então te achegaste a mim,
e uma boca de batom
desenhaste no meu rosto,
dizendo logo em seguida,
em doce e suave tom:
 
– Que isso faria falta
não devias nem supor,
porque já me satisfaz
o que de mais valioso
tens me dado: O TEU AMOR...
 
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   ESCUTO TEUS OLHARES
 
 
 
Nada mudou nos íntimos instantes
a que ainda nos temos dado tanto:
tudo se mostra igual ao que era antes,
em matéria de amor, ternura e encanto.
 
E aqui estamos nós, ternos amantes,
em livre entrega de um ao outro, enquanto
efeitos aromais inebriantes
o amor produz e espalha em nosso canto.
 
Assim, depois que o corpo te pontilho
de beijos, sinto em teus olhos felizes
um desejo exprimir-se em forte brilho.
 
E te atendo, apesar de te calares,
pois escuto o que, em suplica, me dizes
na voz silenciosa dos olhares.
 
 
 
CONFIRMAÇÃO
 
 
Sei que li, não lembro onde,
um texto de teor
mais ou menos assim:
- O homem sempre tem
a idade com que se sente;
sua capacidade de amar
e de se fazer amado
é a que ele acredita ter;
e sua força de realização
assume o tamanho do seu sonho,
desde que ele não se torne
um sonhador do impossível.
 
Ontem, no silêncio da noite,
não sei por que cargas d’água,
essa assertiva veio visitar-me,
e de repente me vi envolvido nela,
a refletir, refletir, até a conclusão
de que ela encerra verdades,
pelo menos, no que guarda
relação com minha vida.
 
Confirmei, aos meus 72:
- que enquanto vivo um momento,
realmente me atribuo
a idade que o momento exige;
- que, ao amar, dou de amor
quanto creio poder dar;
- que, sendo amado, recebo
quanto fiz por merecer;
- e, também, que quando saio
à procura do que quero,
sempre chego a uma conquista
bem maior do que a esperada.
 
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              SORTE
 
 
 
Juntos como sabor e cheiro em vinho,
nós dois – tu para amar-me, e eu para amar-te –
gozamos o calor do mesmo ninho,
sem permitir que nada nos aparte.
 
O nosso amor se nutre com carinho,
e cada um de nós faz sua parte,
tal como neste instante, agarradinho
contigo, aos beijos, fico a confessar-te
 
que, sem nenhuma dúvida, querida,
pretendo dar mais uns milhões de passos
caminhando a teu lado pela vida,
 
porém se agora me levasse a morte,
o fato de eu morrer entre teus braços,
muito além de prazer, seria sorte!...   
 
 
 
 
CONJUGANDO A VIDA
 
 
Meu amor, sei que te AMO 
Muito mais do que eu AMEI
A todas as que me AMAVAM
Nos anos da mocidade.
Por querer Deus que eu te AME,
É que sempre te AMAREI,
E digo que te AMARIA,
Mesmo que tu não me AMASSES.
 
Nessa hipótese, eu daria
Mais razões para me AMARES
Até chegar a sentir-me,
de fato, por ti AMADO.
Seria, pois, a maneira
Mais certa de proceder,
A fim de que acontecesse
Tudo o que agora acontece:
 
Nós dois, juntos, nos AMANDO
Num quadro em que a existência
Vira um eterno momento
De uma alegria sem par,
Sem estresse, e ambos tomados
Pela emoção de uma prece,
Fazendo a conjugação
Do viver – no verbo AMAR.
 
Sempre no tempo presente
De seu modo indicativo,
Mas na forma afirmativa
E na primeira pessoa
Do plural, trazendo um “nos”
(oblíquo) como objeto,
Marcando em sua função
Plena reciprocidade...
Plena reciprocidade...
 
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     VISITA A MOMENTOS
           DA INFÂNCIA
 
 
 
Ao voltar para a infância o pensamento,
vejo a pequena Vera na calçada
e com ela combino um casamento,
igual àqueles dos contos de fada...
 
Sinto, também, a angústia do momento
em que ela parte, pelos pais levada,
e eu começo a amargar o sofrimento
de perceber minha ilusão frustrada.
 
E eu lá... Ainda pré-adolescente,
já poetando um fim de fantasia
e a cena que ficou em minha mente,
 
a golpear-me como dura clava,
onde a doce esperança que partia
dava vez à saudade que chegava...
 
 
 
  EXTREMO
 
 
 
Ao te dar meu amor
exagerei nas doses,
a ponto de fazer-te abusar
de tanto ser amada.
 
E por não conseguir livrar-me
desse modo exagerado
de dedicar-me a ti,
restam-me as conseqüências
dos meus exageros.
 
Sujeito-me a ter-te a meu lado
sentindo-te ausente,
aceito tuas recusas
às minhas carícias
e, ainda, mostro cara de feliz...
 
Nessa obsessão por te amar,
esqueço-me de mim,
fico perdido
até do sentimento de amor-próprio!...
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[Lago, Kleber. Amar e Escrever. São Luís: KCL, 2014]

 

Muito Obrigado!

 
Kleber Lago
 

© Todos os direitos reservados ao autor.

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