sábado, 29 de dezembro de 2012

POEMAS DE OUTROS MOMENTOS

 (Foto: Pedras Verdes)
 
 
A linda foto do rio,
 Você tem toda razão,
 Revela um mágico toque
 De encanto – um bom desafio
 Para a minha inspiração.
 Contudo, não me provoque
 A pôr em mais um poema
 Que, onde eu esteja, estarão
 As águas do Mearim,
 Com sua beleza extrema,
 Correndo dentro de mim.
 
 
   APRENDIZADO
 
O que aprendi da vida
Tornou-me o que hoje sou
E me dá garantia
De que ninguém verá
Minha mão atirando pedras
Nem ouvirá minha boca
Vociferando pragas
Contra alguém.
 
Aprendi a colher rosas,
Escolher as mais bonitas,
Despetalá-las e, silenciosamente,
Sair espalhando pétalas
Por onde passem pessoas,
Para que elas ouçam
Do silêncio do meu gesto
Que lhes quero bem.
 
 
O PORQUÊ DOS SORRISOS
 
Não choro externamente.
Não porque não tenha vontade,
Mas porque não aprendi a fazê-lo.
 
Meu pranto é sempre
Para dentro de mim...
E eu vejo nisso a lição
De que só a mim compete
Suportar as dores
De meus sofrimentos,
Saudades, ausências,
Tristezas, mágoas
 E desilusões...
 
Eis porque procuro
Compartilhar com os outros
Apenas os sorrisos
Que estão sempre em meu rosto,
Reflexos de sentimentos
Infinitamente maiores
Do que os que possam provocar
Esse pranto exterior
Que nunca me alcança.
 
 
 
ENTRE O SALGADO E O DOCE
 
Aqui posso ver a areia alva e fina
Beijada por ondas salgadas
Que sobre ela se derramam.
Poso me encantar com poentes
Que enrubescem a ilusão
De céu e mar se juntando
No horizonte;
Dar meus olhos
À beleza de velas coloridas
Em seu bailado
Sobre o mar ondulado pelo vento;
Pisar pedras
Que atravessaram o oceano;
Ler a história escrita
Nos azulejos de antigos casarões.
Posso, ainda, estar mais tempo ao lado
Da mulher e do filho que amo,
Naturais daqui.
 
Gosto de viver nesta ilha
Dos amores e dos sonhos.
Também (não por culpa sua),
De desamores e desilusões...
Mas não consigo esconder
Que tenho um amor especial
Pela cidadezinha onde nasci
Que não tem mar
Nem velas navegando,
Nem azulejos europeus
Nas paredes da casas...
Uma cidade pequena
Cuja história não vai longe no passado
E ainda pode ser contada
De boca em boca,
 
Por uma gente que aprendeu a ser feliz
E a fazer de cada troca de abraço
Um ato recíproco de amor.
 
Lá, eu apenas sou.
E me sinto multiplicado nos amigos
Que são iguais a mim: livres, sem medos,
Sem tristeza, sem lamentos;
Cantores de saraus informais,
Num botequim qualquer
Ou mesmo ao relento
Sob um céu quase sempre estrelado!...
Amantes que compartilham a paixão
Pelo Mearim que, num lento passar,
Não para nem cansa!...
Poetas capazes de ver
Mães-d’água banhando nuas nos remansos
E de ler poemas que os canoeiros
Escrevem com seus remos
Nas águas que seguem seu curso rumo ao mar
Mas não levam a poesia
De quem vive às margens rio!...
 
Gosto de morar nesta ilha
Que me enche de cheiro e gosto de sal
E que não se zanga comigo
Quando ponho os pés na estrada
Para matar saudades de Pedreiras
E trazer de lá um pouco de água doce
Com que eu lave o rosto de minha alma
Todas as noites, antes de dormir para sonhar
Com a próxima viagem.
 
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MOTIVOS QUE DESMOTIVAM
 
Sinto vontade de pegar o carro
E sair sem destino certo,
Buscando um pouco daquela poesia
Que, num simples lance de olhar,
A gente encontra
Em cenários naturais,
Em coisas estáticas
E em pessoas movimentando a vida
No sentido do bem.
Atendo aos apelos desse meu desejo.
E lá me vou...
 
No primeiro semáforo fechado,
Com as mãos estendidas para mim,
Meninos de rostos desfigurados
Pela cola tóxica que inalam,
Quem sabe, uma inocente procura
De se livrarem dos açoites
Que o mundo real lhes aplica...
 
Sob um viaduto,
Maltrapilhos moradores de rua
Tentam enganar a falta de pão
Passando, de boca em boca,
A garrafa de cachaça barata,
Numa espécie de festim
Em honra à própria miséria...
 
Adiante, no meio da pista,
A cabeça de um homem ferido,
 
 
Vítima de assalto,
Cai sobre o volante do carro
Disparando a buzina,
Num grito angustiante de socorro
Que da voz já não lhe sai...
 
Chega!...
Saio da cidade e ganho estrada...
Calor insuportável,
Mesmo com o ar condicionado no máximo!
A fumaceira que envolve o carro
Não consegue esconder as chamas
Que, a distância, devoram um resto de mata...
 
Fome e sede...
Olho para o lado, e uma placa indicativa
Chama-me a atenção:
“Paca, cutia, veado e jabuti”.
Não nego que goste de tudo isso.
Mas o IBAMA, onde fica?
 
Hoje o dia não está bom para mim.
Pois a cruel realidade do que vejo
Força a poesia a virar-me as costas.
Vou tratar de voltar para casa e dormir,
Mesmo porque não tenho ânimo
Para escrever um único poema...
 
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   TE AMO!
 
Nós dois usamos
Essa forma coloquial
De confissão de amor,
Em que a próclise pronominal,
Mesmo tida por imprópria,
Empresta suavidade
E doçura à expressão!
 
Ambos sentimos a beleza
Da confissão de amor
Por nós ou por outros
Feita nesses termos.
Mas entendemos que ela só terá sentido
Se esse ponto de exclamação,
Comumente usado para enfatizar
A mensagem “TE AMO!”,
Servir também para marcar
A sinceridade afirmativa do emissor,
De modo a que a mensagem,
Assim entendida por quem a receba,
Nunca venha dar lugar
A subjuntivas sombras
De dúvidas e incertezas.
 
Há muitas pessoas no mundo
Que pensam e agem como nós.
Se outras não são assim,
A culpa não é nossa...
Por isso, meu bem, vem cá!
Abraça-me,
Cola teu peito ao meu,
Une tua alma à minha
E não me deixes falar mais,
Para que, certa de que não te minto,
Possas ouvir do meu silêncio:
– TE AMO!
 
 
CONFISSÕES DE UMA SONETISTA
 
 
 
Adoro as liberdades, em poesia,
mas muitas vezes eu me submeto
a uma vontade que me desafia
a versejar nas linhas do soneto.
 
 
E não posso conter minha ousadia
de buscar perfeição, quando me meto
num campo estrutural que a maioria
dos vates já reputa obsoleto.
 
 
Mesmo pisando ovos vou em frente,
medindo versos e os cadenciando,
seguindo a norma em tudo, ponto a ponto,
 
 
até que eu possa, morta de contente,
abrir um riso escancarado, quando
meu soneto perfeito estiver pronto.
 
 
Este soneto é  dedicado a minha amiga  Ana Neres Pessoa Lima Goes, inspirada poeta e po-tencial sonetista que caminha rumo à construção do soneto tecnicamente perfeito.
 
 
   AUTENTICIDADE
 
Não me permito respeito
incondicional a normas,
sem antes debruçar-me
sobre a propriedade
de seus motivos
e a provável eficácia
de sua aplicação,
 
Não me aceito
um simples seguidor
de modelos impostos,
e diante de conceitos e preceitos,
esgoto-me no esforço das análises,
em busca de minhas próprias
conclusões.
 
Reclamo, protesto, se preciso for,
para não me tornar o cordeiro
que se deixe imolar
sem nenhum grito...
 
Só não me sinto impedido
de integrar-me às mudanças
e ajudar a fazê-las,
mas sem deixar de ser eu mesmo.
 
       AUSÊNCIA
 
 
Vejo como tortura uma saudade
toda vez que de mim estás distante
e a sensação de falta que me invade
refletida aparece em meu semblante.
 
 
Eu não encontro em nada o que me agrade,
tudo me irrita, e passo cada instante
como se dentro de uma eternidade
de sofrimento atroz, intolerante.
 
 
Enquanto tu não vens, tentar eu tento,
mas não encontro um ínfimo momento
de calma, no meu mar de impaciência.
 
 
E a cada ausência fico perguntando
se um velho coração pode, e até quando,
suportar as agruras de outra ausência.
 
 
Os poemas contantes desta postagem,  embora já publicados em jornais, revista e outros meios, ainda não estão em nenhum dos livros editados por mim. Estão sendo reunidos numa espécie de coetânea que simplesmente passei a chamar de Outros Momentos, que futuramente deverá se tornar livro, sob o mesmo título.
Ao leitores deste blog agradeço mais uma vez a atenção que têm dispoensado aos meus despretensiosos escritos.
                                Kleber Lago


sábado, 3 de novembro de 2012

LIRA DE OUTUBRO

(Imagem: diariodoandre.com)


A postagem de hoje reúne alguns poemas que compus em outubro findo, numa pequena mostra que se encerra com o soneto AO POETA MAIOR, dedicado ao grande homenageado do mês: o poeta maranhense nascido na Paraíba JOSÉ CHAGAS que comemorou no dia 29/10/2012 o seu octogésimo oitavo aniversário de nascimento para uma vida de luz e de glória literária. 


      METADE(S)
 
Chamam-me de poeta
Porque sou capaz
De mostrar em versos
A beleza que vejo nas coisas,
Os sons que ouço
Da vida em movimento,
A suavidade da música
Instrumentalmente produzida,
O perfume das flores
Viajando no vento...
Também ouço
O que o silencio me diz,
Distingo a distância
O canto de minhas ninfas,
Enxergo o que o escuro me revela
E me inebrio de essências imaginárias...

Sou metade realidade,
Metade fantasia,
E em ambas as situações
Confirmo que não tenho surdez,
Cegueira e falta de olfato.
Mas, se não consigo
Exprimir as percepções
De minha segunda metade,
Sinto-me meio poeta,
Meio mudo.


DESESPERADA ESPERANÇA


Não deixo de esperar por tua volta
e, enquanto espero, não encontro calma,
na saudade que causa uma revolta
de muitas culpas, dentro de minh’alma.

Por te deixar partir, nunca me solta
amarga sensação, como a de um trauma,
que pisa, em rodopio, em viravolta,
meu pobre coração, e não se acalma.

Mais ansioso que qualquer menino
em frente do que quer e não alcança,
faço coisas de um homem já sem tino.

Deito, levanto, chego à porta... E assim,
vou me desesperando na esperança
de que voltes um dia para mim.



INCAPACIDADE
 
Injustificáveis
E persistentemente inoportunas,
Essas sensações de desprezo
Que me ferem a alma!

Só me resta é procurar um jeito
De bloquear a mente
Aos seus ataques
E ir tratando, enquanto posso,
De pensar as chagas
Que elas deixam em mim
E enxugar o sangue
Que delas escorre...

Afinal, sentir-me assim ferido
Não me inspira revolta
Nem me pede revanche,
Pois quem indiretamente me fere
Nem de longe imagina que o faz.
E nenhuma culpa lhe cabe
Por eu não ser capaz
De conquistar o quanto desejo
De sua atenção...


  SEXO, DE CORPO E ALMA

Que um quarto não seja nunca visto
como mero ambiente estabular
de ações reprodutivas,
nem a cama como simples palco
que sirva à ridícula cena
da mulher que abre as pernas
para o homem “usá-la”!

Que não seja apenas uma visão poética
o que em ato se sublima,
da junção de correntes opostas de energia
que provoca no homem e na mulher
esse mútuo e incontrolável desejo
de dar à carne o prazer
que o espírito requesta ao ser humano!

E que tenhamos, na satisfação desses apelos,
a mesma ternura das preliminares
até o derradeiro espasmo de prazer,
para que duas almas plenamente contentadas
permitam que dois corpos, lado a lado,
adormeçam tranquilos, embalados
por sonhos de novos momentos iguais!



     HALLOWEEN

Se estão soltas,
Que venham as bruxas!
Altas, baixas, gordas, magras,
Bonitas, feias, jovens, idosas,
Isso pouco importa...
Estacionem as vassouras à porta
E façam a festa!
Mas nenhuma caia na asneira
De tentar levar-me
Para cozinhar-me em seu caldeirão,
Se não tiver em casa
Tempero de carinho
E fogo de amor.


             MEDO
 
Minha porta sempre estará aberta
Para que por ela entre
Gente que me faça companhia.

Mas peço às pessoas que vierem
Que não esqueçam a cesta-básica,
Cujo conteúdo são coisas muito simples
E sem peso para os bolsos.
Porções soltas de sentimentos
De alegria, amor e afeto,
Misturadas a outras de fantasias
Ou de razões que me incitem a mente
E me permitam, até o meu último dia,
Continuar a fazer o que mais gosto:
Estar junto de gente, ler, escrever,
Falar e dar ouvidos,
No pleno exercício desse duplo papel
De mestre e aprendiz da Escola da Vida.

Medo do que se chama morte nunca tive,
Mas tenho pavor de que ela me encontre
À sombra da ociosidade
E naquele tipo de solidão
Que faz o homem se sentir
Companheiro único de si mesmo.



AO POETA MAIOR                 

Homenagem a José Chagas

Amigo que me inspira confiança,
que me oferece a luz e a claridade
de uma grande lição que não me cansa,
e mais que a ouça, mais sinto vontade!

Apesar das alturas que ele alcança
com sua pena e da avançada idade,
nele enxergo uma alma de criança
desprovida de orgulho e de vaidade.

Chego a notar em seus cantos urbanos
todo o lirismo que ele, infante, via
na singeleza da vida campestre.

São, pois, os seus oitenta e oito anos,
tanto de vida quanto de poesia,
já que nasceu poeta o nosso mestre!


Ao estimado amigo José Chagas,

São simples versos, num soneto que não revela a mestria com que você tão bem já se expressou nesse tipo de estrutura poemática. Mas foi o meio que encontrei, tanto para externar meus sentimentos de admiração, respeito e reconhecimento por tudo que tem feito pelas nossas letras, quanto para, em nome da amizade que lhe tenho, mostrar como o vejo na simples condição de pessoa humana. Que me seja dada a alegria de festejar sua presença no tempo e no espaço da vida terrena, quando a sua idade estiver sendo marcada pelo número formado com a junção dos dois algarismos iguais, subsequentes aos que formam o número que hoje a indica.
São Luís, 29/10/2012


Um forte abraço de agradecimento aos queridos leitores.

Kleber Lago