sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

SONETOS DE AMAR E ESCREVER III


Nesta postagem estão os 14 últimos dos sonetos publicados no livro Amar e escrever.



CONTEÚDO DESTA POSTAGEM
TÍTULO DO SONETO
PG. DO LIVRO
27
A PRESENÇA DE IREACEMA
61
28
APROXIMADAMENTE, QUASE IGUAL
62
29
NOVOS JEITOS
63
30
PIPA
64
31
NEM CONCEITO... NEM LICENÇA
65
32
FANTASIA INFANTIL
66
33
EMOÇÕES EM LEMBRANÇA
69
34
ETERNA SOLIDÃO
70
35
RESGATE
71
36
MEU MAIOR POEMA
72
37
EMBRIAGUEZ DE AMOR
73
38
TRANSLADAÇÃO
75
39
ENTRE O SONHO E A REALIDADE
76
40
CARNAL
79



27
   A PRESENÇA DE IRACEMA                 
                   Homenagem, in memoriam,
          a  Iracema de  Sousa  Brito                 

Lembro que. até em dias adversos
a seus planos, eu era convidado
por ela, a ir ao seu Transual amado
tomar um bom café com bolo... e versos.

Versos singelos, lidos dos anversos
das folha de um caderno bem cuidado,
onde – por estro privilegiado –
com doçura pintou seus universos.

Ao ser queimado seu caderno um dia,
perdeu-se muito do que ela escrevia
com muito amor, em forma de poema.

Pouco restou... Mas foi suficiente
para deixar marcada eternamente,
na poesia, a presença de Iracema.

28
 APROXIMADAMENTE, QUASE IGUAL



Amarelinho – Rua do Passeio,
música brega, a mesa na calçada,
o churrasquinho, a “Brahma” bem gelada,
e eu, tão feliz, a críticas alheio.

Com gente humilde, agora aqui me enleio,
conversando e assistindo à caminhada
da lua, que hoje é cheia e prateada,
as pessoas alegres, e eu no meio...

E esquecido de tudo que é formal,
fico envolvido nessa singeleza
que tal momento de prazer encerra.

Aproximadamente, quase igual
a alguns de quando compartilho a mesa
com meus amigos, lá na minha terra!


29
        NOVOS JEITOS                                        

A vida nos tem sido, bem sabemos,
um palco de alegria e bons momentos,
onde, decerto, há desentendimentos,
mas que não chegam nunca aos seus extremos.

Sem esforços tão grandes ou supremos,
buscamos alcançar nossos intentos,
sem mágoas que nos deixem fragmentos
quanto sem crises que não superemos.

Se até nos falte o ímpeto de outrora
para o prazer nas conjunções carnais,
pouco interessa, pois a cada hora,

os dois vamos achando novos jeitos
de nos amar, de forma que jamais
sejamos um casal de insatisfeitos.

30
                      PIPA

Lá estava no céu se apresentando
uma pequena pipa, flutuante,
presa à linha, a bailar sob o comando
das mãos habilidosas de um infante.

Erguia-se, baixava vez quando,
recuava e em seguida ia adiante,
depois de um duplo ladear, gingando,
tanto mais bela quanto mais distante!...

E enquanto a esse balé ia assistindo,
eu enxergava um quadro de poesia
desenhado, no céu de azul tão lindo,

pela pipa e seu rabo de algodão,
no qual, em pensamento, eu me sentia pendurado, a voar pela amplidão!...


                                                                              31
NEM CONCEITO... NEM LICENÇA

Para dar ao amor definição
os métodos parecem-me imperfeitos,
e quem os usa não faz mais, senão
perder-se em labirintos de conceitos.

Certo é viver o amor em profusão,
tornando seu reclamos satisfeitos,
sem cogitar em como e em quais serão
para nossa existência os seus efeitos.

Dar-se ao amor, de forma intensa e rica,
não tendo de pedir licença à nossa
razão – que nunca sabe e nunca explica

porque, quando o amor no coração
ameaça explodir, não há quem possa
ser capaz de conter sua explosão!...

32
       FANTASIA INFANTIL

Brincávamos durante o dia inteiro
m casa, no quintal ou na calçada,
mas mamãe tinha já por rotineiro
pôr na cama bem cedo a meninada.

Não antes do discurso costumeiro
de que a criança ia ficar mirrada
e o sol ia perder o seu luzeiro,
sem um bom sono após cada jornada.

Na mente desenhava um sol – cansado
de brincar pelo céu – a esmaecer,
enquanto eu,  pelo sono dominado,

quedava a imaginar que o sol dormia,
igual a mim, para se refazer
e despertar mais forte no outro dia...



                                                                              33
        EMOÇÕES EM LEMBRANÇA

Emoções!... Tantas guardo na lembrança!...
Pouco importa se duras ou se amenas,
Hei de mantê-las indeléveis, plenas,
Como estas que tive, ainda criança:

Duas casas da mesma vizinhança,
Uma da outra a dez passos apenas,
Ambas mostrando, ao mesmo tempo, cenas
Tão carregadas de dessemelhança.

Em uma, a chama da alegria acesa
E o tinir de cristais, em brinde à vida
De um novo ser trazido pela sorte.

Na outra casa, a sombra da tristeza
Cobrindo a dor, na amarga despedida
A quem partiu levando pela morte.   

34
      ETERNA SOLIDÃO

Uma “porta e janela” era o seu lar...
Por suas barbas, me lembrava um frade,
Mas fazia questão de se mostrar
Alheio ao povo e à vida da cidade.

Vivera só, sem nunca se importar
Em saber o que era uma amizade,
E também morreu só, sem dar lugar
A que sentissem dele uma saudade...

Desenho, às vezes, na imaginação
Sua alma triste, a amargurar no além
O vazio da eterna solidão,

Como se fosse esse o seu castigo
Por não ter sido amigo de ninguém
Nem deixado ninguém ser seu amigo.


                                                                              35
         RESGATE

Moço, sem Fé, do tipo tresloucado,
sempre entregue às orgias e ao prazer,
julgava-me feliz, até me ver
vencido pelas forças do pecado.

Depois, no poço em que eu fora jogado,
Ccído, sem vontade de viver,
cheguei a me sentir um pobre ser
– corpo e alma no escuro – arruinado...

Mas Cristo, me estendendo as mãos divinas
resgatou-me do poço das ruínas
e para a luz me trouxe novamente.

Desde então, venho andando sem fracassos,
pois qualquer obstáculo a meus passos
Ele me aponta, e posso ir em frente.
.  
36
        MEU MAIOR POEMA

Se realmente sou poeta, devo
sê-lo, porquanto a vida me premia
pela virtude de enxergar poesia
em quase tudo; não pelo que escrevo.

Mas, quando escrevo, não sei dar relevo
a nenhum tipo de expressão vazia
de sentimento, qual não saberia
explicar por que a isso não me atrevo.

Sei que não fico de alma magoada
nas vezes em que tento, e não consigo
falar do nosso amor nada de nada.

Pois, sendo o nosso amor meu grande tema,
só na poesia de viver contigo
já sinto escrito o meu maior poema

                                                                              37
      EMBRIAGUEZ DE AMOR

Vão-se anos de amor e de carinho,
sem que nenhuma rusga rotineira
tenha nos posto, um só instante, à beira
de simples imprudência ou descaminho.

Deliciosa embriaguez de vinho
feito dos frutos da melhor videira,
e que vai nos manter a vida inteira,
unidos pelo amor, em nosso ninho!

Só nós sabemos como nos encanta
Toda a imensa alegria de poder
A qualquer hora declamar, de cor,

um poema que, com ternura tanta,
diz quanto o mútuo amor torna o prazer
da vida a dois poético e maior.

38
          TRASLADAÇÃO

Chega o dia em que a vida nos desloca,
como que dentro de um redemoinho,
do platônico plano e nos coloca
no ambiente real de “estranho” ninho.

A timidez, no início, nos sufoca,
mas não demora para, de mansinho,
irmos chegando àquela boa troca
de beijos e outras formas de carinho.

Nessa troca de toques, a emoção
em nossos corpos gera uma explosão
de frequentes apelos sensuais,

e faz dormir em nós o romantismo,
enquanto dure o intenso realismo
de alucinantes conjunções carnais!

                                                                              39
  ENTRE O SONHO E A REALIDADE

Andas dizendo que me entrego ao sonho
e que, se um sonho meu não realizo,
nele extensão de fantasia ponho
e, como verdadeiro, o poemizo.

É que, fantasiando, me suponho
dentro de um belo e justo paraíso,
longe do que de triste e de medonho
encontro sobre o mesmo chão que piso.

E quero que tu não te desagrades
com esse fato de eu poder, querida,
entender que jamais entenderias

por que não troco muitas realidades,
que ora vejo ocorrerem nesta vida,
por uma só das minhas fantasias.

40
        CARNAL

Tenho a sorte de ser este que ama
a ti, que embora virtuosa e pura,
sabes seguir-me com desenvoltura,
se o desejo carnal em mim se inflama.

Toda vez, quando a isso o amor nos chama,
noto quanto és feliz enquanto dura
a intensa sensação (quase loucura)
da conjunção dos corpos sobre a cama.

Ouvir tuas palavras não preciso,
porque nos teus olhares bem diviso
o brilho do prazer, em mil matizes.

E à proporção que chega aos meus ouvidos
cada um dos teus lúbricos gemidos,
vou entendendo tudo o que me dizes.

                                                                  © [Lago, Kleber. Amar e Escrever. São Luís: KCL, 2014