sexta-feira, 15 de março de 2019

DO MEU ÁLBUM DE HAICAIS



Aqui estão alguns dos haicais compostos em 2015 e 2016. Antecipo agradecimentos aos que me concederem a honra de lê-los.



   EM TUA AUSÊNCIA
   Não cabem os ais
da saudade que me invade
   em dez mil haicais.   

   ACEITAÇÃO
   Eu te amar assim:
envolvida numa vida
   não só para mim.

   LOUVORES
   Presto a cada amigo
dileto que amor e afeto
   divide comigo.

   CAMA
   Se nela o casal
só deita e dorme, há suspeita
   de que algo vai mal.

   PROVIDÊNCIA
   Não me vendo em mim,
eu desativo o motivo
   que me mostra assim.

   ARTÍSTICA LOUCURA
   Jeito como pintas
de mil cores teus "amores",
   misturando as tintas.

  
   SINCERIDADE
   Quando o riso diz
que alguém, a par de um porém,
   se sente feliz.

   BEIJOS
   O que o colibri
dá à flor lembra os de amor
   que tenho de ti.

   PERCEPÇÃO
   Hoje percebi
que meu canto é sem encanto
   na vida sem ti.

   CONCESSIVO
   Apesar de tudo,
cantei: não me comportei
   qual pássaro mudo.

   LEMBRANDO CAMÕES
   O fogo da chama
a nos arder, sem doer,
   só sente quem ama.

   VÃO ESFORÇO
   O casal que insiste
em recompor um amor
   que já não existe.


   CONSTATAÇÃO
   Eu já não consigo
ter no sexo prazer,
   se não for contigo.

   DOMINGO
   Só para o descanso
queria Deus esse dia,
   no qual mais me canso.

   OLHOS
   Só estão cobertos
no fim de agosto, os do rosto:
   os da alma, abertos.

   REFLEXO
   Um simples BOM DIA,
se vem de quem nos quer bem,
    reflete alegria.

   AVE CATIVA
   O seu canto é triste,
tendo, embora, na gaiola,
   água, fruta e alpiste.

   SOL POETA
   Da sombra ele sai,
lindo, e em céu claro surgindo
   faz este haicai.

    PRESENÇA
    Mesmo longe, estás
tão presente em minha mente
    quanto em meus haicais.

    BORBOLETAS
    Toques de jardim,
com belas cores, dão elas
    ao chão de capim!

    SEXO
    Feito sem amor,
é comida deglutida,
    de pouco sabor.

   AFIRMAÇÃO
    Idoso e grisalho,
no amor ainda sei pôr
    calor, e não falho!

   PEQUENA PRECE
    Que o Senhor reparta
comigo e com cada amigo
    amor nesta quarta!

   AMPARO
   Se a vida me aperta,
não muda, pois chega ajuda
   de Deus, por mão certa.


   VAZIO
   Foi o que senti
no desprazer de viver
   uns dias sem ti.

   CONVALESCENDO
   Como uma criança,
não minto ao dizer que sinto
   que repouso cansa.

   SEDUZIDA
   A pudica, enfim,
muda a face, se desnuda
   e se entrega a mim.

   PRIMAVERA
   Simplesmente, é quando
Deus com flores multicores
   fica o mundo ornando.

   ETERNA CRIANÇA
   Travesso e ladino
pinto o sete e, assim, me sinto
    eterno menino.

   AOS AMIGOS
   Toda a luz que emana
de Deus, a vocês e aos seus,
    na nova semana.

   FINGIDOR
   Em prosa e em verso
diz ser pessoa feliz,
   sentindo o inverso.

   PUNIÇÃO
   Fiz por merecer
o castigo de, contigo,
   morrer de prazer.   

   CEIA NATALINA
   Quem pode consome
a sua, enquanto na rua
   muitos passam fome.

   FELICIDADE
   Sublime estesia
de a vida ver convertida
   num céu de poesia.

   INCOMPLETO
   É como me sinto
sem vinho, prosa e carinho,
   em qualquer recinto.
_____________________

© Kleber Lago - Haicais
             15/3/2019
(Imagens compartilhadas do Google)

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

SONETOS DE AMAR E ESCREVER - V



CONTEÚDO DESTA POSTAGEM
TÍTULO DO SONETO
PG. DO LIVRO
49
CABELOS BRANCOS
92
50
MEU JEITO DE AMAR
93
51
NAMORO
94
52
NATAL
95
53
SANTUÁRIO DE SÃO BENEDITO
97
54
O AMOR QUE EU SEMPRE QUIS
98
55
NADA MAIS A PEDIR
99
56
SOBRE SONHOS
100
57
EU... ANO VELHO... ANO NOVO
101
58
NAVEGANTE DO PRESENTE
102
59
SEGREDO
105
60
DANÇANDO A VIDA
107
61
A RESPOSTA
108
62
UM QUADRO DA INFÂNCIA
109
63
FELIZ DEMAIS
111


                                                                             49
          CABELOS BRANCOS
  
Passados já cinquenta e quatro anos
de quando o nosso idílio teve fim,
o destino incluiu entre seus planos
novamente te pôr diante de mim.

Mesmo tendo o destino, em seus arcanos,
o dom de, às vezes, se mostrar ruim,
nesse encontro não houve “rasga-panos”
a respeito de culpa ou coisa afim.

Os dois, tomados da emoção mais pura,
falamos da saudade, em termos francos;
e me tocou, e ainda estou sentindo
  
dentro de mim o instante de ternura,
em que alisando os meus cabelos brancos,
exclamaste: – Por Deus, como estás lindo!...

50
              MEU JEITO DE AMAR
  
Não me importa que o amor inspire chiste
a quem o julgue um sentimento tredo,
pois o valor do meu amor consiste
no direito de amar que me concedo.

Amo, assim como acho que me assiste:
sem dar guarida a inibição e medo,
sem dar olhos ao que me deixe triste,
nem boca a fruto de sabor azedo...

E tenho, por amar dessa maneira,
sensações de que existe uma fogueira
a me queimar de dentro para fora,

e cujo ardor, em vez de me doer,
dá-me a suavidade de um prazer
que do meu peito nunca vai embora!


                                                                              51
                 NAMORO
  
Adoro a noite. A noite é sempre bela
e inspira inusitadas sensações
que tornam brandos nossos corações
com tudo o que de encanto vem com ela.

Agora, por exemplo, abro a janela,
e me sinto nas asas de emoções
que só percebo nas ocasiões
em que o meu eu poeta se revela.

A lua nova, em forma de canoa,
beija rútila “estrela” com a proa,
meio a pontos luzentes bem pequenos,

em cena de beleza fascinante
que o Poeta Maior cria, durante
esse namoro entre a Lua e Vênus!

52
                       NATAL
  
A época em que o povo mais consome
e, ao se envolver em compras, não refreia
os ímpetos que crescem, na cadeia
de uma inquietude eufórica, sem nome.

O espírito cristão, às vezes, some,
como no exemplo de faustosa ceia
que abastada família saboreia,
enquanto muita gente passa fome.
                                                    
Um bom Natal seria a humanidade
vivendo em clima de fraternidade
e sob as bênçãos da Divina Luz...

Mas são ainda sonhos natalinos
ouvir vozes de amor, nos sons dos sinos
que nos lembram a vinda de Jesus...


                                                                              53
    SANTUÁRIO DE SÃO BENEDITO
  
De Pedreiras retorno, abençoado,
cheio da paz que espero em minha vida,
o coração de amor impregnado,
e a consciência de missão cumprida.

Trinta e um anos faz que eu, empurrado
pelas mãos de uma fé mais que incontida,
virei romeiro e ali tenho prestado
a Benedito a honra merecida.

E este ano, de forma especial,
senti em minha alma de romeiro
um mais forte fervor emocional,

por já não ver no plano imaginário
a Paróquia do Santo, padroeiro
da amada terra, feita SANTUÁRIO.

54
   O AMOR QUE EU SEMPRE QUIS
  
Não busquei um amor para um minuto,
para uma hora, um dia, um mês, um ano,
nem pretendi amor substituto,
por uma mero capricho leviano.

Quis um amor, sem me cobrar tributo,
sem metas a cumprir, sem grande plano,
que fosse livre, inteligente, arguto
e até capaz de se mostrar insano.

E te encontrei, sem procurar por ti,
porque de mim estavas muito perto,
tal como agora estás comigo, aqui,

ouvindo-me dizer que sou feliz 
por nossa comunhão ter dado certo
e por teres me dado o amor que eu quis.


55
         NADA MAIS A PEDIR
  
De bons amigos tenho alguns milhares
e, com muita afeição e lealdade,
consigo preservar cada amizade,
sem que nada corroa os seus pilares.

Na rua, em casa, em todos os lugares,
não há nenhum prazer que mais me agrade
que ostentar a grandeza da humildade
ante os amigos e os familiares.

Por entender que a vida é passageira,
vivê-la bem se fez sempre a primeira
e a mais nobre missão dos dias meus.

Assim, já tendo o que desejo ter
e me sentido como quero ser,
não vejo mais o que pedir a Deus.

56
           SOBRE SONHOS
  
Sonhe, mas nunca tire os pés do chão,
pois como meu pai sempre me dizia,
é bom ter algum sonho todo dia,
se ele sugere concretização.

Tem justificativa o sonho vão,
mas somente no campo da poesia,
onde sonhar nos leva à fantasia
e não cede lugar a frustração.

Deixe ao poeta o encargo singular
de idealizar na mente criativa
o que não é possível realizar.

Poeta sabe bem, os outros não,
gerir um clima de expectativa
de ocorrências (reais) numa ilusão.


                                                                              57
    EU... ANO VELHO... ANO NOVO
  
Nunca gasto meu tempo em fazer conta
do que vivi, do que viver me resta;
e enquanto vivo, nada me amedronta,
embora a idade já me franza a testa.

A certeza da morte não me afronta,
o vírus da tristeza não me infesta,
porque bem sei manter minh’alma pronta
para viver quanto morrer em festa.

Sempre que um Ano Velho chega ao fim,
posso até não louvá-lo, mas também
não digo que me trouxe algo ruim.

E acolho com sorrisos de prazer
o Ano Novo, pois quando ele vem,
eu sinto em mim a vida renascer!

58
     NAVEGANTE DO PRESENTE
  
O sorriso no rosto fez-se marca;
humildade e amor, o passaporte
de quem (feliz) a cada dia embarca
na nau da vida, ao bel prazer da sorte.

Assim, vejo que nada me demarca
o espaço a navegar, e alheio a norte,
deixo singrar as ondas minha barca,
sem nunca cogitar onde eu aporte.

Lembro o antes e penso no depois,
mas só navego em águas do presente,
com alegria, indiferente a planos.

E, já no curso dos setenta e dois,
ainda me sinto moço e consciente
de que não temo a dor e os desenganos!


                                                                              59
                SEGREDO
  
Relendo as Quadras para os (meus) Setenta,
a releitura satisfaz-me, pois
o dito ali ainda se sustenta
em meu espírito, aos setenta e dois.

Ao ver que o gosto pela vida aumenta,
neste agora, que lá era o depois,
já penso em festejar os meus noventa,
com as bênçãos que Deus sobre mim pôs.

O meu segredo de felicidade
é ser, de fato, como me apresento:
sincero, alegre, humilde e sem vaidade.

E também (se a falar com Deus estou), 
POR POUCO TER – nunca fazer lamento,
mas sempre agradecer – PELO QUE SOU.

60
          DANÇANDO A VIDA
  
A vida causa-me um prazer sem fim,
como uma dança, na qual me libero
de todo preconceito e não pondero
sobre se é boa a música, ou ruim.

Dançar é algo que me encanta! Assim,
eu vou dançando a vida como quero,
em ritmo de samba ou de bolero,
e sem pensar no que digam de mim.

Frequento igrejas, faço farra em bares,
levo conforto a almas desvalidas,
pratico o bem, cometo meus pecados...

E sei que pelos críticos olhares
virtudes podem não ser percebidas,
mas defeitos serão sempre notados.


                                                                              61
.           A RESPOSTA
  
Nos encontros que nossa turma faz
para um chopinho em tardes de calor,
os meus verbais excessos em louvor
a Pedreiras viraram triviais.

Há nessa confraria um bom rapaz
que, um dia, me pediu para lhe expor
a razão de eu guardar tamanho amor
por uma terra onde não moro mais.

Só que o moço ficou meio sem jeito
quando eu, apontando para o peito
e expressando emoção, lhe respondi:

– É verdade que já não moro lá,
porém minha Pedreiras sempre está
dentro de mim, morando bem aqui!
  
62
        UM QUADRO DA INFÂNCIA
  
Sem mostrar resistência a essa vontade
de visitar os tempos de criança,
ponho na mão meu livro de saudade
e folheio lembrança por lembrança.

O olhar de minha mente assim me invade
a infância por inteiro, e logo alcança
uma linda menina da cidade,
loura, de olhos azuis e fala mansa.

Foi ela, certo dia, sol já posto,
que, após eu mal pisar sua calçada,
parou-me, com as mãos prendeu-me o rosto,

esfregou sua boca em minha boca,
e  em seguida, saiu em disparada
para dentro de casa, como louca...


63
              FELIZ DEMAIS
  
Guardo por minha vida boa e amena
um grande amor, e sinto a toda hora
que, enquanto o amor me alegra e revigora,
pensamento ruim não me envenena.

Sei aceitar de forma bem serena
mesmo o que chegue e logo vá embora;
assim, posso afirmar que até agora
tudo o que já vivi valeu a pena.

Tenho o pouco que quero, durmo em paz,
sempre no estado de feliz demais,
na lide, entre os amigos e no lar.

E só me aventaria desagrado
se porventura eu não tivesse achado
tanta gente no mundo para amar.

                                 © [Lago, Kleber. Amar e Escrever. São Luís: KCL, 2014]