1
FANTASIA
Quando
essa doce sensação me invade,
Meus
pensamentos sem demora vão
À
Minha infância, em busca de ilusão
E
alguns momentos de felicidade.
Cinderela,
Pinóquio, Xerazade...
Pipas
tocando as nuvens na amplidão...
Barquinhos
de papel que ainda estão
Vagando
pelos mares da saudade...
Na
passagem monótona dos anos,
A
verdade dos fatos triviais
Tenta
sempre mostrar os meus enganos.
Mas
minha mente não aceita e opera
Essa
volta às mentiras divinais
Que
ficaram no mundo da quimera!
Pedreiras-MA,
17/9/1957
3
NEM
SONHO... NEM VERDADE
Suaves
sensações de anagogia
Enlevam-me
nas horas do poente,
Quando
apareces repentinamente
E
me beijas com gosto de ambrosia.
Um
delírio!... Uma meiga fantasia!...
Um
momento que em vida não se sente,
E
a exótica ilusão de minha mente
Traz-me
sempre, no fim de cada dia!
É
difícil entender como consigo,
Sabendo-te
distante, estar contigo
Nesses
doces e mágicos excertos.
Não
é sonho... nem pode ser verdade,
Pois
ninguém sente igual felicidade
Mesmo
estando a sonhar de olhos abertos.
Pedreiras-MA 21/8/1958
5
PRIMEIRO AMOR
O
meu primeiro amor nasceu nos anos
Em
que, mal me tornando adolescente,
Atirei-me
na teia dos enganos
E
ali me embaracei completamente.
Fiz
promessas, tracei diversos planos
Para
a vida que tínhamos à frente,
Sem
nunca imaginar que os desenganos
Pudessem
mudar tudo de repente,
Quando
ela foi embora, eu só temia
Que
a frustração me arrebatasse a paz
E
outros sonhos repletos de esperança.
Mas
logo compreendi que a fantasia
Do
meu primeiro amor não fora mais
Do
que simples brinquedo de criança.
Rio, 25/5/1961
7
SONETO
DO EXÍLIO
Eu
nasci em Pedreiras-Maranhão,
Cidade
ribeirinha a mais bonita,
Fonte
primígena da inspiração
Do
que de bom dentro de mim palpita.
Deixei-a
já faz tempo e, desde então,
Minha
tristeza torna-se infinita,
Mas
não apaga do meu coração
A
fogueira de amor que arde e crepita.
Não
deixe Deus que eu morra sem voltar
A
ter diante dos olhos a beleza
De
tudo que deixei no meu lugar;
Sem
que, num gesto meio rude e frio,
Possa
arrancar do peito essa tristeza
E
afogá-la nas águas do seu rio...
Rio,
3/3/1964
9
SEMPRE O
PASSADO PRESENTE
Em tudo há
sombras vivas do passado,
De coisas ou de
alguém que a gente amou.
O presente é um
arquivo bem cuidado
Que guarda tudo
aquilo que passou.
Guarda o
primeiro beijo apaixonado
E a doçura da
boca que o provou...
Guarda o
primeiro abraço que foi dado
E dois corpos
febris aproximou...
Por buscar tais
lembranças, é que vivo
Manuseando
sempre o velho arquivo
Quando a dor da
saudade é impertinente.
E sinto, em
cada quadro ali contido,
A impressão de
que cada amor perdido
Está sendo
vivido novamente!
Rio,
28/6/1963
11
DESILUSÃO
Diante de novos
planos e critérios
Envolvendo-me
todos os sentidos,
Fui levado a
tratar de assuntos sérios
Por um desses
desejos incontidos.
Tentei
desvirginar certos mistérios
Que, em tanto
misticismo confundidos,
Jazem nos
seculares cemitérios
Dos sonhos de
filósofos vencidos.
Vaguei pelo
universo vários anos
Buscando, entre
verdades segredadas,
Dirimir meus
inúmeros enganos.
Mas, ao voltar,
por desventura minha,
Só consegui
trazer (multiplicadas)
Aquelas mesmas
dúvidas que eu tinha!
Pedreiras-MA,
7/12/1965
13
ONTEM, HOJE E AMANHÃ
No passado vivi
tal como quis.
Fui quase tudo,
até poeta e louco...
Se mocinho ou
vilão, triste ou feliz,
Não reclamo da
vida nem um pouco.
Hoje ainda
tenho muito do passado.
Só faço aquilo
que me dita a mente,
E todo o meu
vigor é consagrado
Ao pleno
desfrutar do meu presente.
Sei que esse
jeito de ser livre assim,
Embora a muita
gente desagrade,
Marcará minha
vida até o fim.
E chego a
imaginar-me, já maduro,
No comando da
nau da liberdade
Navegando nas
águas do futuro.
Pedreiras-MA, 15/8/1969
|
2
CONFITEOR
Errei
e fui privado, de repente,
da
ventura de ter a cada instante
aquele
beijo sensual e ardente
que
me punhas na boca, delirante.
Por
culpa minha, minha tão somente,
cumpro
essa pena e trago no semblante
toda
a expressão tristíssima e evidente
de
que o castigo já me foi bastante.
Em
lágrimas confesso que, a despeito
de
minha dor e de meu pranto infindo,
chego
a sentir-me, às vezes, satisfeito
só
pela simples possibilidade
de
que isso tudo esteja ter servindo
como
motivo de felicidade.
Pedreiras-MA,
14/1/1958
4
O
TROMBADINHA
A
correr pela rua, arrebata a carteira
De
um transeunte aqui; de outro lá, o cordão.
Continua
a correr, driblando a massa inteira
Que,
histérica a gritar, tenta agarrá-lo em vão.
Mas,
por sua desdita, uma bala certeira,
Varando-lhe
a cabeça, o faz cair no chão,
No
passo inicial de uma triste carreira,
Cuja
escolha, talvez, teve justa razão.
Pois
era apenas um dos jovens desgraçados
Que,
largados à sorte, encontram boas-vindas
Na
imensa legião dos marginalizados.
Trombadinha,
pivete, o chamem como for,
Furtando,
extravasava as mágoas advindas
Da
carência de afeto e da falta de amor.
Rio, 3/2/1964
6
SOB A SOMBRA DOS RAMOS
Sob a sombra
daqueles verdes ramos,
Depois de um
beijo ardente e prolongado,
Premidos pelas
forças do pecado
Aos prazeres
carnais nos entregamos.
Sem ligar à
razão e aos seus reclamos,
Amamo-nos de um
jeito alucinado
E, de tanto o
prazer termos gozado,
Exaustos, sobre
a relva desmaiamos...
Ao recobrar-me,
no primeiro instante
Julguei que
tudo fora um sonho, quando
Uma voz me
chamou e pude ver
O seu corpinho
nu, tão provocante,
Fremente de
desejo, convidando
O meu para
outros rounds de prazer!
Rio, 17/4/1962
8
CONSELHO
Tu finges que és feliz com tanto
assédio
Que sobre ti provocas muito
enredo.
Por que, se em tua vida tudo é
tédio,
Trazes no rosto esse sorriso
tredo?
Falta-te o pranto, ou a vergonha
impede-o
De correr? Chora, chora enquanto
é cedo!
Que a lágrima é o único remédio
Para as dores que sofres em
segredo.
Não deixes presa no apertado
laço
Do fingimento as horas malfadadas,
como na velha história do
palhaço
Que chega ao picadeiro e mostra
calma,
Escondendo por trás das
gargalhadas
Tristezas que carrega em sua
alma.
Rio, 20/1/1964
10
AVENTURAS
Quando partiste
em busca de aventuras,
carregavas em
tuas fantasias
a certeza de
que retornarias
saciado de
prazeres e venturas.
Mas com coisas
incertas e obscuras
tu consumiste
em vão noites e dias,
provando nos
caminhos que corrias
o amargo
dissabor das desventuras.
Hoje, de volta,
quase como louco,
cabisbaixo, tu
choras passo a passo
o ver tragada a
própria confiança
pela decepção
que te faz pouco
do corpo todo
cheio de cansaço
e da alma vazia
de esperança.
Pedreiras-MA,
12/5/1965
12
BUSCANDO O FIM
Levantam nossos
pés nuvens de poeira,
Vencendo
prados, areais e montes
Na confusão da
última carreira
À procura de
novos horizontes.
Deixamos para
trás vales e fonte,
Lares,
conquistas de uma vida inteira...
Ante abismos
profundos e sem pontes,
Se alguém fala
em voltar, não há quem queira!
Durante a
marcha, parecemos certos
De que há oásis
em todos os desertos
E brotam flores
em qualquer jardim.
Vamos
seguindo... Mas ninguém pressente
Que, mesmo
caminhando para frente,
Também se pode
não chegar ao fim.
Pedreiras-MA,
6/1/1969
14
LAMENTO
O caminho da
vida mais se estreita
E em meu peito
a tristeza se retrata,
Enquanto o
tempo a fronte já me enfeita
Com os seus
fios mágicos de prata.
É do destino a
trágica receita:
Derrama em
nossa vida, qual cascata,
Tanta emoção
que com mestria ajeita
Numa mistura à
fórmula que mata.
Não me importa
saber que a morte é certa.
Dói-me, sim,
entender que a vida é breve
Para quem vive
de alma sempre aberta
E sabe
intensamente desfrutar
Essa euforia
que só se descreve
Colocando em
destaque o verbo amar.
Rio, 21/2/1976
|
© [LAGO, Kleber.
Palavras e Outros Poemas / Kleber Cantanhede Lago / São Luís: KCL, 2009]
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