quarta-feira, 18 de maio de 2016

2016 - Cantares de Fevereiro

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MEARIM EM PROTESTO

Novo e triste cenário desacata
minhas lembranças do correr macio
do velho Mearim por entre a mata,
navegável, piscoso, até no estio.

Nada tinha do que hoje se retrata
nas margens, já tão cheias de vazio,
que despencam de si, como em cascata,
assoreando mais e mais o rio.

Poluem-no e o tratam com descaso,
mas Deus, que a tudo assiste, vez em quando,
esquecendo a divina gentileza,

fá-lo esbornar do leito sujo e raso
e invadir as cidades, protestando
contra o deszelo pela natureza...
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POR INSTINTO

Percebo quanto é forte a carne fraca
toda vez quando, em mim, o seu apelo
se faz desejo e com fervor me ataca,
sem que eu possa evitar satisfazê-lo.

Mas não lamento, na moral ressaca,
nem me culpo por não ter tido o zelo
de manter uno o que nunca se aparta
do dualismo, e expô-lo ao desmantelo.

Pois, se separo espírito e matéria
sempre que não consigo me conter
e trato o amor de forma pouco séria,

é por instinto e para ver, de fato,
se na junção carnal vale o prazer,
estando a alma ausente desse ato...
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DANÇANDO A VIDA

A vida causa-me um prazer sem fim,
como uma dança, na qual me libero
de todo preconceito e não pondero
sobre se é boa a música, ou ruim.

Dançar é algo que me encanta! Assim,
eu vou dançando a vida como quero,
em ritmo de samba ou de bolero,
e sem pensar no que digam de mim.

Frequento igrejas, faço farra em bares,
levo conforto a almas desvalidas,
pratico o bem, cometo meus pecados...

E sei que pelos críticos olhares
virtudes podem não ser percebidas,
mas defeitos serão sempre notados.
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AINDA FAREI MUITOS RASTROS

Pouco importa minha idade
contada em anos vividos,
não vou submeter-me à ociosidade
física e mental,
enquanto meu corpo
for capaz de se movimentar
e meu cérebro dispuser
de lucidez.

Há muitos rastros pendentes
nos chãos que piso
nessas minhas incessantes buscas
por belezas que ainda não vi,
por mistérios que ainda não desvendei
e pelo instante poético
que ainda não consegui
traduzir em versos.


Nunca vou ficar inerte
a espera da morte,
nem lançar um olhar, mesmo de soslaio,
em sua direção,
pois amo muito a minha vida,
seja pelos prazeres que me tornam alegre
seja pelos eventuais desgostos
que não conseguem deixar-me triste...


A morte que corra atrás de mim,
já que é sua missão,
mas ela deve estar ciente
de que trenei bastante para essa corrida
e de que vai ter de enfrentar
muitos obstáculos
e levar muitos tombos
antes de alcançar-me...
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DA CASA E DO CORAÇÃO

Minha casa é muito pequena
como era a de Sócrates,
mas se não a vejo cheia
de verdadeiros amigos,
não é porque não os tenha,
e sim porque lá não há espaço
para acomodá-los.

Em compensação,
meu coração é imensamente grande
em amor e carinho,
está sempre de porta aberta
e pode comportar
todas as amizades sinceras
que queiram nele abrigar-se.
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VIVO A IDADE QUE ME DOU

Quem busca ser feliz não se amedronta,
se vive a idade com que se imagina:
eu, como a juventude me fascina,
sintro-me sempre um jovem de alma tonta.

Assim, nunca procuro me dar conta
do meu cabelo que embranquece e afina
nem me certificar do que combina
com o que o gosto de fazer me aponta.

Se qual adolescente me comporto,
mesmo com quatro além já dos setenta,
podem julgar-me louco, eu não me importo.

Pois sou o louco, cuja insanidade
é por viver e amar, enquanto aguenta,
no possível padrão de intensidade.
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FESTIVO

No dia (não tão cedo) em que eu me for,
ganhe meu corpo o sacro ritual,
mas depois o carreguem, por favor,
para o sepulcro, em tom de carnaval.

Não quero a mínima expressão de dor
nem de tristeza um ínfimo sinal,
pois se o viver festejo com fervor,
quero festa também no funeral.

Desejo, lá no Alto, entre outras almas,
já dentro da existência do pós-morte,
sorrir, dançar, cantar e bater palmas,

feliz com a festiva despedida
da matéria carnal que deu suporte
aos meus atos de amor na humana vida!
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 Imagem compartilhada
 MEU BERÇO

Só os olhos de quem ama
são capazes de enxergar
toda a beleza que existe
nesse pedaço de chão
banhado por águas mansas
que, tal como correm lá,
correm nas minhas saudades
E VÃO ME INUNDANDO A ALMA
DAS MAIS FELIZES LEMBRANÇAS!...
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           Abraços e agradecimentos aos queridos leitores.

                                                                  Kleber Lago
© Kleber Cantanhede Lago

terça-feira, 10 de maio de 2016

Lira de Começo de Ano - 2016




Minha Lira de Começo de Ano – 2016  ficou marcada pela presença da extraordinária sonetista Edir Pina de Barros, que reputo uma das melhores que temos na atualidade. Quanto me foi honrosa a surpresa que tive, no dia 13 de janeiro de 2016, quando ela me dedicou o soneto Eu canto o amor, inspirado em outro (Sempre presente), com o qual eu homenageara a memória de minha primeira esposa, pela passagem do 19º aniversário de sua viagem para a eternidade!

Eu canto o amor
           Edir Pina de barros

O verdadeiro amor jamais fenece
e sobrevive além da eternidade,
enflora sempre em forma de saudade
e mesmo na silente e terna prece.

Jamais em nossa vida se arrefece
o vero amor. E nada um dia há de
quebrar o seu encanto. E na verdade
um grande amor ninguém na vida esquece.

É como o sol, renasce a cada dia
e aquece a nossa alma. É luz, poesia
cantada por graciosos passarinhos.

Por isso eu canto o amor. E canto e canto
para louvar o seu fulgor, encanto
sempre a juncar de versos meus caminhos.

Sempre presente
                      Kleber Lago

Sobre o amor de verdade nutro a crença
de que em nós ele sempre subsiste,
e físicas ausências nos compensa
pelas lembranças com quem nos assiste.

Numa saudade que, apesar de imensa,
não me dói nem me deixa ficar triste,
tens sido para mim uma presença
constante, desde o dia em que partiste.

Pensando em ti, eu nunca estou sozinho,
pois revivo, na mente, cada lance
dos anos de ternura e de carinho.

E até me cheiro... e vou podendo assim,
em minha pele, onde o nariz alcance,
sentir o cheiro do teu corpo em mim.

Fã de carteirinha de Edir e adorador do bom sonetear dos bons sonetistas, costumo visitar a pagina Sonetos de Edir Pina de Barros para deliciar-me na leitura de seus escritos. Numa dessas visitas, encontrei uma foto dela, aos dezenove anos. E, como poeta tem comportamentos que parecem anormais para quem é completamente normal, copiei a foto e colei-a ao lado de uma foto minha, eu também aos dezenove, mas completados muito antes dos dela. Aí, comecei a divagar e coloquei em paralelo as nossas jornadas pelas rotas da Poesia, passando a perceber uma grande afinidade entre nós, acentuadamente no que concerne a sermos, ambos, além de cultores do soneto, cantores do maior, mais belo e mais significativo dos sentimentos humanos: o AMOR. Vejam o soneto que resultou dessa minha divagação:

DOIS CANTORES DO AMOR
                                 Kleber Lago

Bem antes, sim, dos dezenove anos,
cada um de nós dois já se envolvia
nessa doce missão de, entre os humanos,
cantar o Amor nas vozes da Poesia.

Pelos caminhos, em locais urbanos,
no universo real, na fantasia,
vamos cantando o amor e seus arcanos,
como uma obrigação do dia a dia.

Temos alma de pássaro cantor,
e nossas penas, mesmo em tons diversos,
transformam tudo em cânticos de amor,

mas seus acordes só vão alcançar
quem for capaz de, ao ler os nossos versos,
sentir em si quanto é sublime amar.
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E este outro, dentro do mesmo contexto, também dediquei  a Edir, como forma de lhe agradecer o carinho e atenção a mim dispensado por ela:

ASSIM VEJO O AMOR
                            Kleber Lago

Coisas do amor prescindem de argumento,
vão ser sempre ocorrências naturais,
desde o sorriso à exclamação dos ais
provocados por esse sentimento.

Cabe, no amor, qualquer procedimento:
enlaçar, desatar, não querer mais,
juntar de novo... e até o que se faz
só no desejo, sem fruir o intento.

O amor é sentimento singular
que vale, mesmo na presença ausente
de quem conosco está formando par.

E não perde os encantos, a despeito
de o outro lado não mostrar à gente
seu coração vibrar dentro do peito.
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 Imagem do Google

 NUNCA VOU ESQUECER

Ela, com sua magia,
anulava a minha idade
e, em sexo, conseguia
dar-me e ter saciedade.

Não me adianta tentar,
pois nunca vou me esquecer
de quem me fez delirar
em turbilhões de prazer.

A relação teve fim,
mas não se desfez em mim
a paixão pela mulher

que hei de manter como minha
sempre louca "Cabritinha",
enquanto vida eu tiver.
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E POR FALAR EM TEMPO

Não gosto da frase
"O tempo é cruel",
pois o tempo não tem culpa
de passarmos por ele.

Nessa passagem,
entramos num contexto dualista
em que uma das partes é máquina,
e máquinas se desgastam,
estejam paradas ou em movimento.

O tempo não é cruel,
nós é que não sabemos ser fortes
na parte essencial,
e devíamos aprender
a não temer o espelho que reflete
o desgaste da outra parte,
para não termos de andar por aí
culpando o tempo.

Teorias à parte,
tempo é simples noção
que julgamos ou procuramos ter
da duração das ocorrências conosco
e com o que está em volta de nós,
no espaço que ocupamos.

Afinal, temos de dar sentido
às formas que criamos
para contá-lo e medi-lo...
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SÓ QUERIA ENTENDER

Cadê aquela relação bonita
que os dois vivemos de uma forma ardente,
cuja recordação ainda me excita
desejos de vivê-la novamente?!


Não sei como suporto esta desdita
de hoje vê-la mudada totalmente:
estar junto de mim você evita
e, quando está, sempre parece ausente...


A sua frigidez para comigo
faz-me sentir uma tristeza imensa,
e por mais que eu me esforce, não consigo


achar um jeito de entender por que
sou, apesar de sua indiferença,
tão fascinado ainda por você...
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 Imagem do Google

A VERDADE

Era assim:
eu e tu vencendo o chão
de caminhos convergentes
para o encontro de amor,
nosso amor, nosso segredo
de indescritíveis prazeres...

Mas certo dia encontramos,
no ponto de convergência,
cerca bem tecida e alta,
erguida pelo ciúme
de quem já se suspeitava
vítima de traição.

Desde então,
não mais pisamos
aqueles caminhos;
se por medo ou covardia,
isso não sei afirmar.

Verdade
é que nenhum de nós
teve coragem
para a iniciativa
de pular a cerca...
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SEM TEMPO E SEM RAZÃO PARA APRENDER

Se ouço de alguém
que estou com uma expressão triste,
olho dentro de mim e vejo minha alma
a sorrir, feliz por animar alguém
que não deixa prosperar sentimentos ruins
e que não sabe ainda como são as sensações
do que chamam de tristeza.

Na verdade,
nem tenho tempo para aprender,
pois o tempo que me sobra,
fora as horas reservadas ao sono,
eu o divido equitativamente
entre coisas que, em meu entendimento,
só me causam alegria:
o labor pelo pão farto na mesa,
a satisfação dos apelos da carne
e a busca, na realidade ou na fantasia,
por poéticos motivos de emoção
para mim e para os outros.

Acho que não conseguiria aprender
como é ser triste,
mesmo que roubasse e dedicasse a isso
um bom pedaço de cada um
desses pedaços de tempo.

Agora mesmo, enquanto escrevo este poema,
estou sentindo muitas saudades
de alguém que já não está comigo,
mas as saudades se metamorfoseiam
em gostosas lembranças.

Ai, afasto os olhos
do papel dos meus rabiscos
e, mirando-me no espelho
de minhas próprias sensações,
vejo nele o reflexo do meu rosto,
tão sorridente quanto encontrei minha alma,
no instante em que voltei aquele olhar
para dentro de mim...
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O MAIOR E MELHOR DOS MEUS BENS

Tu conheces e aceitas o meu jeito
de ser e de viver. Também conheço
como tu és e, porque assim te aceito,
vamos segundo juntos, sem tropeço.

Do que entre nós se mostra tão perfeito
a reciprocidade é sempre o preço,
enquanto o que me dás eu não rejeito
e recebes o quanto te ofereço.

São poucos os meus bens materiais,
e a eles eu não dou muito valor,
por seu desfrute, às vezes, ser fugaz.

Eis a razão de todo o meu empenho
em gozar, por inteiro, o nosso amor:
o maior e melhor dos bens que eu tenho.
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               Mais uma vez agradeço a atenção dos leitores deste blog. Abraços!

                                                                            Kleber Lago
© Kleber Cantanhede Lago